Política

Arcabouço fiscal: quais serão os impactos na economia?

Novo arcabouço fiscal foi apresentado ao Congresso nesta semana

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) entregou na última terça-feira (18) a proposta do novo arcabouço fiscal ao Congresso Nacional, que substituirá o teto de gastos, constantemente criticado pelo chefe do Executivo por limitar o crescimento dos gastos públicos apenas à variação da inflação do ano anterior.

Na visão de Idean Alves, sócio e chefe da mesa de operações da Ação Brasil Investimentos, o novo arcabouço fiscal será essencial para o combate da inflação ao longo de 2023. De acordo com o analista, a nova proposta fiscal também anima os investidores por trazer mais previsibilidade sobre quais regras o governo precisará seguir pelos próximos anos.

“O arcabouço fiscal poderá ajudar a arrefecer a inflação em 2023, e até mesmo contribuir para um eventual corte de juros ainda esse ano. Tudo dependerá de qual arcabouço fiscal vai passar no Congresso, o quanto será diluído, e quais melhorias vai implementar. No entanto, de modo geral, uma regra fiscal mais clara, e exequível por si só, já anima o mercado por ver a possibilidade de nela ter mais previsibilidade e clareza sobre quais serão as regras do jogo para os próximos anos”, afirmou Alves ao BP Money.

“Esse cenário pode ficar ainda mais favorável se, além dela, o governo conseguir aprovar uma reforma tributária, pois assim ele poderá tentar casar uma expansão fiscal saudável, sem extrapolar as contas públicas. É essa esperança que o novo arcabouço fiscal traz também, de que um fiscal menos “perigoso”, com controle do endividamento público, pode ajudar a levar a inflação para o centro da meta”, acrescentou.

Para o período de 2024 a 2027, o novo arcabouço fiscal estabelece que as despesas públicas não poderão crescer mais do que 70% da variação da receita líquida recorrente do governo. Ainda haverá um piso e um teto para balizar esse crescimento de gastos, que poderá variar anualmente entre 0,6% e 2,5% acima da inflação.

Se o piso for desrespeitado, haverá uma limitação mais forte para o crescimento das despesas, com a margem para ampliação de gastos no ano seguinte caindo de 70% para 50% da alta das receitas.

O texto do novo marco fiscal também prevê que o presidente da República terá de encaminhar uma mensagem ao Congresso Nacional em caso de descumprimento das metas de resultado das contas públicas.

Diferente de Alves, José Augusto Gaspar Ruas, economista e coordenador do curso de Ciências Econômicas da FACAMP, acredita que o novo marco fiscal do governo Lula pouco poderá agir contra a inflação brasileira, que tem arrefecido nos últimos meses. Na opinião do economista, a economia brasileira está desaquecida, algo que tem contribuído para queda dos últimos índices IPCA. Por conta desse contexto, é improvável que o novo arcabouço consiga mexer ainda mais com a inflação do País, que já está desacelerando.

“Eu acho que o arcabouço fiscal, no momento em que estamos vivendo, é menos relevante para inflação em si e mais relevante como estabilizador de uma das expectativas que o mercado financeiro tem em relação a taxa de juros longa”, disse.

“No segundo semestre de 2022, a inflação foi combatida não só com a elevação da taxa de juros, mas com uma política de desoneração intensa que se somou também a uma redução progressiva dos preços, por exemplo, do petróleo. Por conta disso, no final do ano passado, a economia brasileira já começou a mostrar sinais de um desaquecimento muito forte, tanto que o crescimento do PIB no último trimestre foi negativo. A economia não está crescendo, e eu diria que a tendência nesse momento é que a inflação se mantenha dentro da meta”, argumentou Ruas.

Novo arcabouço fiscal mexe com a taxa Selic?

Após o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), apresentar o novo arcabouço fiscal, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, afirmou que o novo marco fiscal afastaria o risco de uma explosão da dívida pública. No entanto, Campos Neto negou que as regras apresentadas pelo governo Lula garantem uma queda imediata da taxa básica de juros, a Selic, que atualmente está em 13,75% ao ano.

“Não existe relação mecânica entre o fiscal e taxa de juros na forma como é colocada. O importante para a gente é atuar dentro do sistema de metas. Nós temos uma meta de inflação e olhamos as expectativas. O mais importante é como as medidas que estão sendo anunciadas afetam o canal das expectativas”, disse Campos Neto em 5 de abril.

Apesar da declaração do presidente do BC, Alves crê que, caso o novo arcabouço fiscal funcione e ajude a aliviar a pressão das contas públicas e a arrefecer a inflação, o órgão monetário poderá ser obrigado a rever o atual patamar da taxa de juros brasileira.

“O fiscal é o principal ponto de “gatilho” para um eventual corte de juros, colocado inclusive pelo Roberto Campos Neto nas atas do Copom, que um “fiscal mais comprometido” contribuiria para o Comitê manter a política de juros no patamar atual por mais tempo, e que a mudança nesse cenário poderia levar o Copom a rever esse cenário. Então, uma inversão da curva de juros, que estava prevista apenas para 2024, pode sim acontecer ainda em 2023 caso o novo arcabouço fiscal ajude a aliviar a pressão das contas públicas e da inflação”, argumentou o chefe da mesa de operações da Ação Brasil Investimentos.

Em contrapartida, Fábio Tadeu Araújo, sócio dirigente da Brain Inteligência Estratégica, diz que a criação de um novo marco fiscal traz incertezas para o mercado, pois não é sabido se ele será suficiente para a economia brasileira ou se será até mesmo aprovado no Congresso. Por conta disso, é difícil dizer se o novo arcabouço fiscal poderá auxiliar o Banco Central a cortar a taxa de juros atual.

“A política monetária entendida pelo BC precisa de um suporte maior da política fiscal, ou seja, daquela que o Ministério da Fazenda toma conta do seu dia a dia. Neste momento, embora não exista uma irresponsabilidade por parte do executivo, existem sim incertezas. Nós não temos a certeza de que este novo arcabouço dará conta do recado ou se ele será até mesmo aprovado”, explicou Araújo.