Enron: relembre maior fraude da história

Entender como uma das maiores empresas do setor de energia do mundo nos anos 90 seguiu caminhos fraudulentos.

O ano era 1985 e acabara de surgir a Enron, uma companhia de energia estadunidense que se dedicava à exploração e distribuição de eletricidade e gás natural. Após estabelecer-se no mercado, a companhia decide expandir os horizontes e diversificar suas receitas, com a iniciativa de investir em distintas áreas como frequência de internet, gerenciamento de risco e derivativo climático (um tipo de seguro climático para negócios sazonais). A partir de 1990, a empresa passa a ser vista como uma companhia híbrida, de gás natural e serviços financeiros, com o diferencial de que, agora, passa a somar ao time o consultor especialista Jeffrey Skilling.

Esta poderia ser a história bibliográfica de uma grande companhia, porém os fatos irão se encaminhar para um desfecho no ano de 2001, data que viria a ser considerado como determinante para a economia mundial, não tendo relação com o atentado às torres gêmeas. A única comparação que pode ser feita sobre o World Trade Center é de que, na análise de especialistas, a Enron teve maior impacto no mercado financeiro do que a queda das torres.

Para entender como uma das maiores empresas do setor de energia do mundo nos anos 90 seguiu caminhos fraudulentos é preciso retornar para a última década antes dos anos 2000, quando a companhia desenvolveu um sistema de negociações financeiras, composto por especialistas em gás e traders de Wall Street. O mecanismo criado pela Enron permitia a empresa funcionar como uma mesa de operações, intermediando negociações entre compradores e vendedores, desta forma obtinha lucro com o spread (a diferença). 

A partir da nova administração de Jeffrey Skilling, a empresa passa a adotar métodos contábeis que, embora estejam dentro da lei, eram utilizados de forma maliciosa e quando aplicado gerava informações divergentes da realidade. Uma prática contábil desenvolvida pela companhia, foi a criação de Special Pourpose Entities (SPE), que significa Sociedade de propósito específico. Por meio da criação destas entidades, a Enron conseguiu captar empréstimos de bancos, contrair dívidas gigantescas e se alavancar financeiramente, sem que isso aparecesse nas demonstrações financeiras.

Desta forma, ao analisar os indicadores da empresa, só seria possível notar uma receita crescente e uma dívida que não aumentava. O fluxo de caixa e os resultados entravam na companhia mas as dívidas não apareciam. Ao longo da história, cerca de 3 mil SPE foram criadas.

Como efeito em cadeia, a equipe de contabilidade financeira da Enron fazia parecer, por meio das demonstrações financeiras, que seu patrimônio crescia exponencialmente. Com isso, os bancos facilitavam o investimento para a companhia e os analistas, por sua vez, recomendavam suas ações, que explodiram na bolsa de valores norte-americana. Seu crescimento chegou a ser tão assombroso que se converteu na sétima maior companhia estadunidense e no ano 2000 alcançou um valor de US$ 68 bilhões.

Vale mencionar ainda que, como as entradas de capital não eram reais, a companhia pagava pouco em impostos, complicando ainda mais a situação real contábil e jurídica da companhia. A performance promissora era celebrada pelos acionistas, que não imaginavam que a companhia viria a se tornar uma referência em fraude do colarinho branco.

A queda
As estratégias da Enron começaram a ser analisadas de forma mais cuidadosa pelas autoridades em 2001, quando o setor de comunicações iniciou uma série de perdas na bolsa de valores norte-americana. Dentro e fora da empresa começaram a surgir boatos sobre a grande fraude que estava sendo conduzida pela companhia. Coincidentemente,  Jeffrey Skilling e o então presidente, Ken Lay, deixaram os seus postos com  justificativas embasadas em razões pessoais, protegendo os seus recursos pessoais através de operações de mercado de capitais. 

A SEC (US Securities and Exchange Commission), entidade que regula o mercado de capitais nos Estados Unidos conduziu uma intensa auditoria na companhia e reconheceu que a Enron reportou durante vários anos lucros muito maiores do que os reais. O governo dos Estados Unidos abriu dezenas de investigações criminais contra executivos da Enron e da Arthur Andersen. Quando divulgada a fraude, a empresa se viu obrigada a divulgar perdas de US$ 68 milhões em outubro de 2001, fazendo o preço de sua ação cair de US$ 86 para apenas US$ 0,30. A companhia foi também processada pelas pessoas lesadas. De acordo com os investigadores, os executivos e contadores, assim como instituições financeiras e escritórios de advocacia, que à época trabalhavam para a companhia, foram, de alguma forma e em diferentes graus, responsáveis pelo colapso da empresa.

Jeff Skilling e Ken Lay foram ambos indiciados em 2004 por suas participações da fraude. Em 25 de maio de 2006, um júri da corte federal em Houston, Texas, declarou tanto Skilling quanto Lay culpados. Jeff Skilling foi condenado por 19 casos de conspiração, fraude, comércio ilegal e declarações falsas e começou a cumprir a pena em dezembro do mesmo ano. Estas acusações levam a uma sentença máxima de 185 anos combinados. Ken Lay, por sua vez, foi condenado por seis casos de conspiração e fraude. Em julgamento separado, Lay foi também declarado culpado por quatro casos de fraude bancária. 

Ken Lay faleceu em julho de 2006, vítima de um ataque cardíaco, segundo noticiou o jornal “The New York Times”. Com sua morte, acredita-se que nunca será possível saber exatamente o que levou a empresa ao colapso. Outra morte envolvendo o caso, foi do  executivo da Enron Corporation, John Clifford Baxter, que foi encontrado sem vida em 25 de janeiro de 2002 dentro de seu carro, com um tiro na cabeça. A polícia suspeita que J. Clifford Baxter teria se suicidado, uma vez que a perícia encontrou uma carta de despedida ao lado do corpo, seu conteúdo não foi revelado.

O mercado de capitais não foi mais o mesmo após o escândalo da Enron, já que a situação escancarou as falhas e fez necessário que houvesse uma revisão, tanto nos regulamentos contábeis, como nas práticas da governança corporativa das entidades. O mercado já utiliza o termo “enronite” para referir-se ao temor de que outras empresas também tenham seus balanços camuflados, escondendo despesas e outras contas que afetam o seu resultado. Após todos julgamentos, sentenças e prisões, o principal resultado da situação foi a aprovação da lei “Sarbones-Oxley Act”, que escreveu as regras para a governança corporativa, controles internos, papel da monitoria e divulgação de relatórios financeiros.