Projeção pessimista do BC para os juros já tinha sido internalizada pelo mercado mesmo antes da "super quarta"

Consenso apontava para nova alta, com Selic saltando para 13,75% ao ano em 2022, e dificuldades de sustentar meta para a inflação na meta em 2023

A ata do comitê de política monetária do Banco Central do Brasil desta terça-feira (21) não foi nenhum choque para o mercado, por reforçar os indicativos da reunião da última semana, mas pesou as tintas sobre o horizonte econômico. Se houve gente otimista com 2023, agora não há mais. A entidade já pavimentou o caminho para a Selic em 2022, que deve ficar acima do cenário base, de 13,25% ao ano, mas a boa notícia é que a perspectiva para encerramento do ciclo de alta dos juros não está mais tão longe. 

As más notícias: o Copom começa pela primeira vez a reconhecer que não será possível cumprir a meta de inflação para o próximo ano, o que provocou um reajuste nas perspectivas. A incerteza sobre as premissas de cenário e projeções é maior do que o usual e cresceu desde a última reunião, reconheceu o comitê em ata. O ambiente provoca um cenário de juros mais altos por mais tempo. 

“Os números trazidos pela ata mostram que o panorama visto pelo BC é negativo”, trouxe a análise da Levante Investimentos sobre o comunicado, que ganhou título “Uma ata pessimista”. 

O cenário não está mais dando margem ao otimismo, então é preciso ser bem mais pé no chão para lidar com os problemas persistentes. As projeções de inflação para o ano subiram de 7,7% para 8,8%. Para 2023, a estimativa subiu de 3,4%, na meta, para 4,0%. Um balde de água fria para quem acreditava numa queda mais relevante nos indicadores.

“No cenário referência, o BC trouxe uma Selic em torno de 10% no fim do ano que vem, mas a entidade já indica que a tendência é de ficar um pouco mais alto. Portanto, revisamos nossa projeção, antes de 10,25%, para 10,75%”, explicou Victor Beyruti, economista da Guide Investimentos.

Para Victor Candido, economista-chefe da RPS Capital, o principal recado do Banco Central é o reconhecimento de que o patamar de juros atual não é suficiente para conter a inflação nem desaquecer a economia. “Em resumo, a entidade diz que teremos que ter mais juros por mais tempo do que inicialmente se imaginava”, afirmou o especialista. 

Mercado reconheceu a inevitabilidade de nova alta dos juros antes do BC

Antes da “super quarta”, o mercado já tinha alcançado um consenso: o patamar atual de juros não era mais suficiente para conter a alta inflacionária. Uma semana após o anúncio sobre o aumento da Selic em meio ponto percentual, o BC reconheceu sua realidade, e seguiu o mesmo caminho.  

O comitê admitiu nesta terça-feira (21) a possibilidade – ou a necessidade, como aponta a Levante Investimentos-  de elevar novamente os juros na próxima reunião, agendada para o início de agosto. 

Para a maioria das gestoras, como Alphatree e Claritas, assim como para a Guide Investimentos e para a equipe de economistas do Itaú, a expectativa é que a taxa básica de juros suba mais 50 pontos-base. “O mercado já está precificando uma alta de 0,5 p.p., mas não vemos probabilidades altas de a Selic ir muito além disso”, comentou o economista da corretora.

O economista-chefe da RPS Capital, no entanto, prevê uma subida menor para a curva da taxa básica de juros. “A não ser que tenhamos uma piora significativa da inflação, tudo indica que teremos mais 0,25 p.p. e o ciclo de alta deve parar, provavelmente até entrando no segundo semestre de 2023 com a taxa neste nível”.

Costa reconhece, por outro lado, que o cenário desenhado pelo BC, de desafios no mercado externo com correção no preço das commodities e desaceleração na economia global, o que diminui a precisão das projeções sobre o movimento da entidade. “Ele [BC] está se preparando para uma parada. Se ele vai parar dando mais um aumento de 0,25 ou 0,50 na próxima reunião, não sabemos”, complementou. 

Mas as questões de convergência da inflação para um valor em torno da meta do BC para o horizonte relevante, isto é, o próximo ano, já tinha sido internalizado pelo mercado desde a última decisão do comitê, no dia 15 de junho, explica Beyruti. 

O aperto monetário, que a própria entidade entende como intenso e intempestivo, já foi feito, e as projeções do Banco Central já estão bem negativas, até mesmo mantendo o patamar de preço do barril de petróleo acima dos US$ 110. 

O que acontecerá daqui para frente, portanto, será uma calibração diante da tão esperada resposta que os indicadores precisam dar. Fed e Banco Central Europeu iniciaram agora seus trabalhos, subindo os juros nesses mercados, o que deve ajudar a arrefecer a inflação por aqui. A ver se a orquestra monetária encontrará sintonia de agora em diante ou se continuará seus desarranjos.